Em 2007 comemora-se o aniversário de 90 anos da Revolução Russa de 1917 e 40 anos da morte de Che Guevara na Bolívia. Os mitos e o idealismo dessas datas camuflam a mais assustadora criminalidade do século XX. Poder-se-ia dizer que o comunismo foi a pior e mais destruidora tragédia da história humana. Em números de mortos, supera o nazismo e demais guerras mundiais somadas. O golpe de Estado bolchevique de 1917 foi o prenúncio da devastação de um país: a Rússia no começo do século XX era um das nações mais ricas do mundo. Ao contrário da mitologia esquerdista, possuía um dos mais audaciosos sistemas de educação pública da época e ainda uma das maiores frotas comerciais do mundo. Um pouco antes da revolução, 50% da população russa já era alfabetizada, graças às reformas de Alexandre II, o mesmo que libertou os servos em 1861. Embora no país predominasse a população agrária, essa característica não era em si comum à Rússia, mas a vários países da Europa; a industrialização, financiada pelo capital francês, inglês, alemão e nacional, fazia germinar um país moderno e empresarial. Por outro lado, a Rússia era uma das maiores produtoras de cereais e alimentos do mundo, tendo seu recorde de safra em 1913, cálculo jamais superado pelo regime comunista. Há de conjecturar que, embora houvesse a cultura autocrática e repressiva do czarismo, a sociedade russa conheceu um esplendor intelectual inimaginável, nas figuras de escritores como Dostoievski e Tolstoi e músicos como Tchaikovski e Rachmaninov, entre outros. Sem contar uma verdadeira elite de cientistas, educadores, matemáticos e biólogos, gerados por esse esplendor.
No entanto, em 1917, toda essa realidade mudou. O que poderia ser o destino de uma nação potencialmente próspera acabou caindo no pesadelo mais profundo do totalitarismo. O bolchevismo conseguiu destruir completamente uma sociedade constituída. Massacrou os quadros intelectuais, econômicos, políticos e militares mais significativos da sociedade russa. Impôs terror, violência e destruição em todas as esferas da vida social. E conseguiu arruinar completamente um país. Comerciantes, intelectuais, administradores, aristocratas, matemáticos, empresários, profissionais liberais, proprietários de terras, clerigos, quase todos foram aniquilados pelo terror vermelho. Quando esses grupos sociais deixaram de existir, o terror se generalizou entre os operários e camponeses, ora assassinados, ora reduzidos a mais completa tirania. A matança indiscriminada da população se associou a mais completa criminalização da vida social. Milhões de pessoas foram presas e deportadas para os campos de concentração na Sibéria e em outros locais da União Soviética. Na verdade, milhões de pessoas foram usadas como mão de obra escrava, para sustentar a inépcia econômica do regime. A indústria nascente russa foi destruída, e a coletivização, junto com o massacre de milhões de camponeses pela fome, escasseou e esgotou a produção de alimentos. A Rússia, que no inicio do século XX exportava alimentos, hoje é uma importadora de comida. Graças a Lênin, que matou cinco milhões de camponeses de fome. Graças a Stalin, que matou outros seis milhões e desestruturou a agricultura russa, tornando-a completamente inócua.
Mas o bolchevismo não foi apenas um sistema de criminalidade, terror e destruição inaudita do povo russo. Ele devastou o Leste Europeu e massacrou os melhores quadros intelectuais, econômicos e políticos dos países ocupados. Espalhou seu veneno pela Ásia, África e América Latina, com o preço de miséria, opressão e homicídios em escala demencial. Imbecilizou o povo, tornando-o servil ao Partido e à sua ideologia estéril e sufocante. Exterminou a liberdade civil e política dos povos. Insuflou guerras, caos e revolta por onde passou. E como um sistema imperialista, expandiu a dominação e impôs despotismos em qualquer lugar por onde se estabeleceu. Foi, em suma, uma ameaça à civilização e as suas liberdades, uma ameaça de levar o mundo no século XX ao reino das trevas.
Impressionante é presumir que uma ideologia tão destrutiva e tão inspiradora de genocídios seja algo a inspirar os intelectuais. De fato, o bolchevismo é uma ideologia de intelectuais radicais, uma idealização que sacrifica a realidade ao plano da loucura. O simulacro de sofisticação em Marx, Lênin, Engels, Rosa e seus congêneres mais vulgares, como Mao Tse Tung e adjacências, não sobrevive ao peso da realidade. Porém, a intelectualidade se corrompeu: o século XX foi o século da mentira, o século da mentira e cumplicidade dos intelectuais. Raramente se mentiu tanto pela ideologia. E o socialismo foi capaz de falsificar a história e a realidade pela ideologia. O mito em torno da Revolução Russa é um emaranhado de falsificações. Mentiras e mais mentiras repetidas a exaustão, até que se tornem verdades sacralizadas. Daí a entender a tamanha popularidade de mito, ainda que a realidade denuncie os piores crimes.
E Che? Che Guevara é produto dessa mentira histórica, dessa cumplicidade criminosa dos intelectuais do século XX. O mito Che não sobrevive à realidade; ele é o contrário daquilo que representa. Em nome da liberdade, foi um defensor das piores e mais criminosas ditaduras, criador de campos de concentração e trabalhos forçados em Cuba. Prócer do idealismo e da vida faustosa, não passava de um fanático e um assassino em massa, executor sumário de centenas de inocentes. E para aqueles que idealizam a paz mundial, era um homem que acreditava na violência como resposta para todos os problemas do mundo. Se o movimento terrorista, com sua crença fanática na destruição como resposta para tudo, surgiu no niilismo russo e instaurou sua ação política de Estado na Revolução Russa, Che Guevara é a personificação do Netchiaev, do espírito do terrorista russo no militante latino-americano. Já havia precedentes para isso: a revolução francesa já tinha inaugurado o terror do Estado revolucionário, na ação dos jacobinos e suas guilhotinas, esses bolcheviques de perucas. Todavia, o moderno “terrorismo de Estado”, em sua escala monumental de violência, por assim dizer, é uma inovação comunista, já que o movimento comunista é, por definição, um movimento terrorista dentro e fora do poder.
Países economicamente arruinados, miserabilizados, indigentes; povos bestializados na servidão, na mentira, na estupidez e na ignorância, vítimas de uma ideologia nauseante em todas as esferas intelectuais, políticas e culturais da sociedade; regimes tirânicos, policialescos, traiçoeiros, destruidores dos laços morais e espirituais de solidariedade humana, na delação, no medo e no terror; assassinatos, expurgos, deportações em massa e milhões de cadáveres. Como diria um historiador, é o sacrifício do homem comum, verdadeiro, imperfeito, autêntico, pelo plastificado “homem novo” socialista, artificial, desumanizado, despersonalizado. Ou nas palavras de Nelson Rodrigues, uma “antipessoa”. No total, cem milhões de mortos em todo o mundo. Esse é o preço do comunismo em toda a história do século XX. Há o que comemorar?